sábado, 26 de março de 2022

Amor infinito

O preto, o negro, no seu sentido denotativo e conotativo da palavra, vem sendo ligado historicamente a um sistema conceitual na sociedade humana, ao ilegal, ao sujo, a falta, a problema, ao macabro, passando a ideia de de negativo, como mal e ruim, anteposto ao bem e ao bom.
Aqui... 

...as duas palavras coexistam, porém sem a carga negativa que o racismo estrutural incrustou. 
Marcos Sacramento

Neste espaço de expressão apresento 
os ensinamentos, as belezas e bênçãos que me trazem. 
Um amor infinito.



domingo, 25 de maio de 2014

Por que tantos preconceitos...?



“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, ou por sua origem, ou sua religião. 
Para odiar, as pessoas precisam aprender; e, se elas podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar, ...”
Nelson Mandela

13 de maio

Por que tantos desamores 
Contra os feiticeiros negros 
Que só querem levar flores 
Para Iemanjá 

Rebater nos seus tambores 
Os açoites da vida 
E com a alma redimida 
Fazer festa no mar 

Iemanjá Sobá, Miregun, Iyabá 
Senhora das Cadeias 
Odoiyá 

Por que tantas palavras 
Contra os feiticeiros negros 
Que só querem liberdade 
Pra saudar Xangô 

Relembrar nos seus tambores 
A história perdida 
E com a alma redimida 
Cantar em seu louvor 

Xangô Agodô é Justiça e Amor 
Xangô Agodô, Kaô Kaô 

Por que tantos preconceitos 
Contra os feiticeiros negros 
Se a cultura do amor 
Não discrimina cor 

O navio negreiro já miscigenou 
E em cada negro tem um branco 
Que a princesa libertou 

É hora de dançar 
Para o rei Nagô 
É hora de cantar 
O que Zumbi ensinou 

Ojú Obá ô Zaze ê 
Ojú Obá ô Zaze ê 
Ô Zaze ê Ojú Obá 
Ojú Obá ô Zaze ê

Encerrando-se mais um mês de maio, a caminho de 20 de novembro.
E a luta continua...


segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Madona Negra do Brasil

Mês de Outubro.
Mês das crianças, dos educadores, de Nossa Senhora Aparecida - Mãe Oxum.

Mãe Educadora,  Aparecida é a Mãe Negra dos brasileiros.
Anjo Negro que ressurge das águas num país do povo mesclado e construído pela mãos e um povo negro.
Povo brasileiro que é esta mistura de cores, crenças, culturas.

Aparecida faz parte da nossa história e é preciso compreender sua mensagem.

Lucy Penna, mestra e doutora em psicologia, autora do livro Aparecida do Brasil, a Madona Negra da Abundância/2009, realizou pesquisas para explicar os significados do mito que encanta o povo, e apresenta sua compreensão como psicoterapeuta junguiana do fenômeno Aparecida.


O momento histórico do Brasil: período já em decadência do sistema das Capitanias Hereditárias, quando o rei entregava uma capitania a algum membro da corte de sua confiança que, a partir de então, se transformava em capitão donatário para fundar vilas, doar lotes de terra, exercer funções judiciárias e militares, cobrar impostos e aplicar a escravização.  Abandonados pelos órgãos públicos, os pescadores angustiaram com a encomenda para pescar o banquete em homenagem ao conde de Assumar, o novo governador da província de São Paulo e Minas Gerais, que passaria pela Vila de Guaratinguetá, com uma comitiva de cerca de 500 pessoas. 

O mistério: passando a noite pescando três homens simples nada encontraram. Na insistência um deles encontrou na rede, primeiro o pedaço do corpo e, depois, a cabeça de uma imagem. É o primeiro mistério: nas águas correntes surgem as peças seguidas uma da outra e se encaixam.  O segundo mistério é que após este fato a pesca foi abundante. Existe aí um milagre.

Nasce o mito: A imagem, identificada como uma santa católica, não sendo primeiramente identificada foi chamada de Aparecida. Foi aceito imediatamente o milagre que salvou os pescadores naquele momento de dificuldade. E, a partir da divulgação do evento, dos atos de fé da comunidade local, a crença se estabeleceu.

Miscigenação: Neste momento que a mistura de raças e de culturas se estabelecia surge uma santa negra, em plena escravidão. E quem a cultuava eram os negros, os mamelucos, os indígenas e os mulatos, fora da igreja. Assim mesmo a crença se espalhou e Aparecida se tornou padroeira daquele lugar, a padroeira do Brasil. Nos dias atuais ela é cultuada em várias regiões e por várias religiões.


Simbolismo: A autora coloca sobre o seu ponto de vista o simbolismo em vários níveis.

1. "A nação é como o corpo de um ser e o governo deveria ser a cabeça, capaz de organizar. No Brasil, no momento, eu vejo uma separação impressionante";

2.  Da crise social emerge a identidade dos povos. A força representa a capacidade do povo de se reorganizar e lutar pela própria identidade. Havia uma crise de identidade ameaçando a constituição do povo. No decorrer do tempo e momento social a identidade foi pela cor, a mãe negra que protegia quem buscava o ouro, que movia a economia da época. Nessa fase ela é o ouro negro, que virou ouro preto,  Vai sendo dado conotações diferentes para a mesma imagem em cada período;

3. Sobre a questão da imagem ter surgido quebrada, sem cabeça, a autora, que trabalha em psicologia com o corpo, dentro da noção junguiana, discorre sobre o que é integridade do corpo e cabeça e sobre a profunda da busca da integridade, do caráter íntegro. Analisando a divisão entre cabeça e corpo, dentro do caráter político, 
a autora aponta a cabeça enquanto governo e o corpo enquanto nação. "A nação é como o corpo de um ser e o governo deveria ser a cabeça, capaz de organizar. Mas no Brasil, no momento, eu vejo uma separação impressionante. A abundância só vai acontecer quando o corpo e a cabeça estiverem unidos";
4. Estudando vários autores sobre a formação da cultura brasileira Lucy coloca ainda que as partes de Aparecida representa a divisão entre uma herança materialmente trazida pelos europeus, enquanto civilização racional, científica, baseada na ordem e no progresso, e as heranças indígena e africana funcionando em outra lógica. Estes povos acreditam que tudo no universo tem uma força cósmica – as águas, os ventos, o sol, as pedras, as plantas, os animais, – e procuram viver em harmonia com todos estes elementos. A busca pelo progresso com a ordem estabelecida sacrifica totalmente o outro lado, o lado que reverencia e respeita a natureza, curte essa natureza exuberante, mantém e festeja, a seu modo, esta riqueza.
 5. O sagrado feminino está ligado às águas e ao seu poderio. "Aparecida emerge do rio para nos mostrar que a água não é silenciosa e, como a nossa psicologia está voltada para esse feminino das águas, ela representa a maternidade das águas. As águas vivas nos têm e vão nos parindo o tempo inteiro. Uma das fontes para essa minha compreensão da parição das águas (parição, não aparição!) é o mito disseminado na Amazônia inteira de que o povo das águas, como são chamados os indígenas, veio de uma transformação de seres que habitavam dentro dos rios." As iaras, mães d'agua, sereias, Oxum, Iemanjá, são o princípio do feminino no planeta, encontrado no fluxo das águas: nascentes, lagos, rios, fluem, acumulam, nutrem e abastecem o oceano, onde, conforme a teoria científica, tudo começou.
Enfim, a Madona Negra Brasileira  tem  função sociológica, mais ligada à cor de Aparecida, para nossa aceitação como povo miscigenado,  com a nossa morenice. Aponta para o perigo da dissociação coletiva por conta da discriminação. Somos de várias tonalidades, e, portanto, corresponsáveis pela evolução de todos na sociedade.
A função sociológica está ligada a função pedagógica de estruturação do sistema social. Enquanto cabeça separada do corpo, não se tem igualdade de oportunidades e fartura na vida. "Cabeça significando capacidade de organização, previsão de recursos, planejamento, direção de vida. O corpo significando a força de trabalho, a alegria de viver e o gosto de saber que eu estou fazendo porque gosto de estar com as pessoas na fartura, na abundância. Alegria! Principalmente alegria de viver, e a sexualidade está dentro disso."
E a função espiritual de Aparecida  ''significa um alcance metafísico no seguinte sentido: a relação do feminino é a relação da escuta do mistério, da escuta mais atenta de poderes transcendentes que atuam nesse planeta, atuam no Sistema Solar e em outras esferas maiores que nós, seres humanos; comunicam com ondas magnéticas, e outras ondas que ainda não descobrimos, informações importantíssimas para que saibamos quem somos, de onde viemos e para onde vamos.''
Fonte de leitura:

domingo, 15 de setembro de 2013

FORÇA AFRO



Gritaram-me, Negra!

Este poema da   afro-peruana Victoria Eugenia Santa Cruz Gamarra, Nascida em 27 outubro 1922 - La Victoria, Lima, Peru.
Ela é compositora, coreógrafa e desenhista, expoente da arte afroperuana.


Me chamam de negro (Mestre Luís Renato)
As vezes me chamam de negro
Pensando que vão me humilhar
Mas o que eles não sabem
É que só me fazem lembrar
Que eu venho daquela raça
Que lutou pra se libertar
Que criou o maculele
Que acredita no camdomblé
Que tem o sorrizo no rosto
A ginga no corpo
E o samba no pé.
Que fez surgir de uma dança
Uma luta que pode matar
Capoeira arma poderosa
Luta de libertação
Brancos e negros na roda
Se abraçam como irmãos.
Camarada o que é meu,
     É meu irmão
Camarada o que é meu,
 É meu irmão. 


segunda-feira, 13 de maio de 2013

Dia 13 de Maio


BOM DIA AMIGOS E DEVOTOS DE NOSSOS PRETOS,

Falar em humildade é falar em sabedoria, não existe sabedoria sem experiência portanto a todos nossos amados pretos velhos, neste dia peço que eu continue sendo merecedor de seus ensinamentos e sua humildade, em especial ai meu querido PAI THOMÉ que me ajuda,me clareia, me ampara e me guia, felicidades a todos pretos velhos que vivem entre nós. Obrigado pai Thomé por ter misericórdia de todos nós e com seu bom humor ensinar a todos que vão em sua frente o significado da palavra respeito!

Everton Alfonsin - Caco -
 Aparelho de Pai Thomé
Canoas/RS

domingo, 5 de maio de 2013

Sabedoria de Preto Velho

Neste mês no qual homenageamos a Linha de Congo devemos, especialmente, nos voltar para a SABEDORIA DOS PRETOS VELHOS que nos movimentam com a sua humildade para a reflexão sobre nossa vida.
Robson Pinheiro teve 30 anos de aprendizagem com o espírito  Pai João de Aruanda e publicou o livro Sabedoria de Preto Velho. Uma leitura indicada para os filhos de fé nesta linha que conversa conosco na sua linguagem simples sobre vida, família, trabalho, equilíbrio,  perdão, alegria, coragem, passagens, perdas... para a busca, como diz Robson, da conquista de si mesmo: "conversa do negro que vê a liberdade por trás das correntes que prendem o homem aos desafios da vida terrena." 
Deixo aqui, também, uma mensagem advinda das conversas com Pai Thomé. Suas Ditas são nos primeiros domingos de cada mês, e estou indo para mais uma delas. No começo do ano 2012 ele usou uma expressão de alerta cujos acontecimentos me fez construir este material que deixo aqui partilhado.
Obrigado meu Pai Thomé.






domingo, 17 de março de 2013

QUILOMBO, ALMA FEMININA



Era o final do século XIX, Maria Luiza Andrade Paim, ex-escrava, e seu esposo Manoel Barbosa dos Santos, ex-escravo e ex-soldado do exército nacional na Guerra da Tríplice Aliança contra o Paraguai, regularizam seu terreno na zona rural de Gravataí e dão ao quilombo o nome do patriarca, pois mulheres não tinham direitos legais, só lhe restavam passar os seus bens adquiridos para os esposos e filhos homens. Lá o casal teve 12 filhas, entre elas, Rosalina Correa dos Santos, nascida em 1908.
Anos mais tarde Rosalina, mais conhecida como Rosa, casou-se com João Maria Genelício de Jesus. Por volta da década de 1940 decidem mudar-se para uma terra próxima, entre arroios e capões, como trabalhadores rurais, onde ela passou a trabalhar na horta e ele como lenhador.  Rosa e João, meus avós, tiveram 13 filhos.  No lugar escolhido intensificaram pomares e plantações de flores para se sustentarem. Hoje o espaço se encontra em meio ao centro urbano, cuja paisagem muito mudou.


E a liderança feminina se firmou. Tudo começou com a Rosa... Com a Rosalina... Que plantava Rosas... Que vendia Rosas... Fazendo conhecer a sua Chácara das Rosas.  Sua família se ampliou e a partir do viver quotidiano com características únicas tornou-se uma comunidade.  Formou sua identidade em meio aos sentimentos partilhados, valores, influência histórica cultural. Mas, também com muita luta para garantia do direito territorial e no combate ao racismo e preconceitos. O local passou a ser conhecido como Chácara das Rosas em Canoas/RS, que um século após passou a ser reconhecido como um dos primeiros quilombos urbanos do Brasil.
Importante salientar que avó Rosa, após o falecimento de seu esposo, com auxílio dos filhos, além da horta e da floricultura, fazia quitutes caseiros (bolo de milho, bolo de aipim, doces, pão em forno de barro) bordava colchas de retalho, criava galinhas, porcos e gado para a sustentação do dia-a-dia da família, mas, também para comercializar nas feiras e no mercado Café Colonial, um tipo de central de alimentos da época. Avó Rosa era a parteira e a benzedeira da região, uma referência no território, uma alternativa de atendimento, quando não havia muitos recursos na época.  Desta forma desenvolveu a ancestralidade das curas, cultura de nosso povo, que se manifestava através do feminino e do uso dos elementos da natureza. Este fundamento foi resgatado e desenvolvido com a criação do Terreiro dentro da comunidade pela minha irmã Liege, retomando as práticas da avó Rosa através da religiosidade afroumbandista.  As demais práticas e exemplos da avó Rosa foram tendo seguimentos pela família. Tia Diolinda, juntamente com Tio Tonho, mantiveram a cultura das ervas com sua utilização. Seus canteiros são a farmácia da comunidade até hoje. As primas Beatriz, Rosa, Noemi e Neusa são destaque no artesanato e culinária colocando o Quilombo dentro da economia solidária do município. A culinária foi sempre um costume de trabalho coletivo realizado pelas mulheres, em círculos. A tia Miguelina, apesar de sua limitação mental, sempre apoiou na preparação dos doces (laranja, abóbora, figo, batata). A prima Elisabete (Bete) é o exemplo de cuidado com a saúde chamando a todos para a manutenção da beleza e auto-estima. Outro exemplo seguido foi pela Tia Tereza Goulart (Tia Nega) na organização e cuidado das crianças, com ajuda da Tia Miguelina, permitindo o movimento das demais mães para irem trabalhar fora. Atualmente sua filha Rosângela (Tia Rô) está com esta responsabilidade. Tia Carminha reside atualmente na casa que era da avó Rosa. Estamos em processo de estruturação, fomos contemplados no Programa do Governo Federal Minha Casa, Minha Vida, que ainda tem muito que avançar. As famílias remanescentes de Rosa e João estão recebendo, cada uma, sua casa e tia Carminha lutou muito pelo direito de guardar as madeiras da primeira residência do local. Nossa avó, uma riqueza de saberes, sempre buscou ampliar horizontes e fez acontecer. Como ela, minha prima Ângela partiu para fora da comunidade, atrás de formação acadêmica, quando ainda somos vistos como pessoas sem cultura. De todas as formas a continuidade da liderança da avó Rosa se manifesta. Sua luta por melhorias ainda hoje está presente em nossa luta. No decorrer da história do Quilombo um dos acontecimentos que mais nos marcou foi a iluminação da comunidade em 2009. Lembro quando minha tia Abrilina, filha mais velha da avó Rosa, de 82 anos, olhou pela janela a noite e disse: - Isabel parece dia! 
Minha liderança também se espelhou no seu grande exemplo, e na forma como meu pai João dos Santos Genelício conduzia o diálogo para resolução de problemas internos da comunidade. Após o falecimento de meu pai decidi participar ativamente e, a partir daí, se iniciou o processo de criação de uma associação, pois me recordo que durante uma reunião os membros da minha família estavam muito desmotivados e compreendi que neste momento era a hora de entrar na luta por nossos direitos.  Também, com minha mãe Glaci Goulart Genelício aprendi muito, pois ela agrega as mulheres do entorno chamando para chás e feijoadas, e estes momentos sempre foram de grande debate e reflexão.
Com o passar do tempo os problemas da comunidade foram se avolumando. No entorno éramos reconhecidos como os pretos, cujo espaço era chamado de planeta dos macacos; sem acesso a qualquer política pública não tínhamos saneamento básico em pleno centro da cidade, em meio a valorização territorial. Através do movimento quilombola junto a outras parcerias foi criado em 2007 o grupo de apoio à Chácara das Rosas. Foi um momento de despertar, de muita afirmação, onde parecia tudo tão perfeito com minha irmã Liege na liderança religiosa e eu a frente da Associação criada no Quilombo.  Fortaleceu-se a partir daí a participação das mulheres, cujas ações a favor de sua comunidade movimentou conhecimentos que se traduziu em poder pessoal e influência social. Firmou-se todo o tipo de liderança, independente da idade e da forma de decisão: apaziguadora, cuidadora, multiplicadora, criadora, relatora, divulgadora, artista, produtora, articuladora... As protagonistas são as filhas, noras e netas da Rosa: mães, irmãs, tias, sobrinhas, primas, juntas, combatendo, a seu modo, o preconceito, o racismo e demais conflitos dentro e fora do Quilombo.
Uma grande contribuição no processo foi a do Terreiro do Quilombo Reino do Pai Ogum. Destaco a coragem e a força do Babalorixá Liege – na pessoa de meu irmão Edson Genelício - que garantiu o direito de exercer o culto de matriz africana, reconhecendo e resgatando a identidade de nossos ancestrais. A liderança religiosa de minha irmã Liege impulsionou as demais lideranças femininas. Sua resistência de forma organizada, a preocupação com o fortalecimento do sentimento de comunidade, de pertencimento, traz alternativas de sustentabilidade através de chás beneficentes, galetos e festas com o objetivo de arrecadação de fundos e doações para o auxílio aqueles que mais necessitavam. O Terreiro passou a ser uma referência, onde nós, mulheres do Quilombo, passamos a nos reunir mais, nos empoderando e desenvolvendo novas redes de apoio e parceria, com o objetivo de auxiliar na resolução de problemas identificados junto a nossa comunidade tradicional. Intensificamos a confecção de artesanatos diversos, envolvendo a todos, e passamos a comercializar em diferentes eventos.  Passamos, também a realizar reuniões e oficinas de capacitação de acordo com as necessidades. Este Terreiro foi um centro especial, como o braço de uma mãe que acolhe seus filhos, uma vez que, com o tempo, as moradias precárias e a extrema falta de estrutura, significavam problemas e conflitos, requerendo diálogo constante, união e o entendimento na comunidade. Neste sentido as mulheres não ficaram somente confinadas ao seu espaço doméstico, mas colaborando e liderando na busca de soluções.
Em 2009 a Associação Remanescente Chácara das Rosas foi, finalmente, registrada com seu estatuto. Neste mesmo ano a comunidade recebeu a sua titulação como Quilombo Urbano. Em março de 2011, por ocasião do dia da mulher, a associação, apoiada pelos parceiros, organizou o I Encontro Regional das Mulheres Quilombolas com o tema Inspirando Esperança, Invocando Mudança. Reunimos familiares e amigos de outros quilombos do Estado, além de representantes do poder público e de Ongs.  O objetivo era discutir a força da mulher quilombola como protagonista de ações locais para que as demais políticas avancem, cujas articulações integradas ajudam a estender sua força e reconhecer seu poder de realização. Foi um encontro onde foram debatidas as políticas públicas, cultura e direito para atender os anseios e preocupações com a construção de uma vida saudável, com a família, com as crianças e jovens, dentro e fora da comunidade. Pude perceber os avanços na nossa e nas demais comunidades em participação, iniciativas e conquistas que fortaleceu o sentimento de pertencimento à cidade, à região e a sua história.  Este encontro alavancou nosso processo de desenvolvimento para a formação de uma rede de mulheres quilombolas parceiras com o objetivo de se auxiliarem na resolução de problemas específicos, identificados junto as comunidades tradicionais. Queremos honrar a nossa herança, cuidar dos nossos membros, apostar no futuro.
Esperamos criar um Centro de Formação e Capacitação para que, a partir de nossas demandas junto às políticas públicas, possamos abrir as portas da nossa história, cultura, costumes e valores aproximando assim a Comunidade Quilombola da nossa sociedade. Para isso, minha irmã Neusinha assumiu um papel importante de registro de nosso movimento auxiliando na tradução de nossas demandas. Como neta de Rosa e João, busco articular a continuidade dessa luta de quatro gerações, na manutenção de nossos direitos e da identidade negra, passada para nossas crianças cujo aprendizado pretendemos firmar na crença do poder de realização. Pretende-se com este Centro de Formação preservar os valores desta comunidade, oferecer o conhecimento desta história, passando de geração em geração, mantendo o respeito pelos idosos que lutaram e resistiram pela identidade do Quilombo.
 Nesta nova trajetória seguiremos em frente com os saberes da avó Rosa, com as forças iluminadoras de minha Mãe Iansã e de todos os Orixás, mantendo a esperança em meus filhos, e principalmente, na continuidade da força da alma feminina representada pela minha filha Gabriela.
Isabel Cristina Genelício
Janeiro/2013

Este texto concorre ao Prêmio Mulheres Negras Contam Sua História da Secretaria de Políticas para Mulheres da Presidência da República.